Henrique, o brasileiro

Henrique, o brasileiro
Por: Dilmercio Daleffe


Henrique está com 68 anos. Nunca se casou. Não teve filhos. Sem família, está sozinho no mundo. Também está desempregado. E ele precisa trabalhar. Distante da aposentadoria, foi obrigado a se transformar em coletor de recicláveis. Caso contrário, estaria nas ruas. Sem teto e sem comida. A vida, definitivamente, não tem sido gentil com ele. Todos os dias, acorda bem cedo. Apanha o carrinho e percorre cerca de 30 quilômetros. Ele não possuí saídas. Na chuva ou no sol, o peso é o mesmo: carrega entre 200 e 240 quilos, seja na descida ou na subida.

Henrique Mateus é um senhor tranquilo. Chapéu de palha, calça surrada e chinelos de dedo. Anda conforme o vento sopra. A meta é buscar materiais recicláveis, o dia todo. Ele transforma o lixo, em dinheiro. Não é muito. Segundo ele, quando o mês é bom, a grana varia entre R$400 e R$500. Do total, R$200 fica ao aluguel. Uma casinha bastante simples no Jardim Batel, em Campo Mourão. Outros R$70 são para a luz e a água. O que sobra, quando sobra, é para a comida.

A entrevista aconteceu em meio a rua. Local de trabalho. Estava cansado. Havia acabado de subir uma via inclinada. O esforço foi imensurável. Com o carrinho cheio, o peso era desumano. Ainda mais, para alguém próximo dos 70. Conta Henrique que nasceu em Mamborê. Lá, morava junto aos pais. A família detinha 88 alqueires. Trabalhou desde os seis na lavoura. Mas, com o tempo, o pai foi vendendo partes da terra. Acabou sem nada.
Com o tempo, mudou-se ao Mato Grosso do Sul. Em Taquiraí, virou sem terra.

Permaneceu algum tempo, até ser despejado pela polícia local. Mais adiante, parou em Naviraí. Lá, conquistou vaga em uma fazenda. Colhia mandioca, cortava mato. Fazia um pouco de tudo. Mas, logo, recebeu comunicado de uma irmã. Dizia que a mãe estava doente. “Me pediu para vir a Campo Mourão cuidar dela. Eu vim”, disse.

Henrique cuidou da mãe, até que ela morresse, há quatro anos, vítima de câncer. Tinha 83 anos. Desde então, ele continua em Campo Mourão. Aqui, emprego não encontrou. Buscou o direito a sua aposentadoria. De acordo com ele, o caso está nas mãos do juiz. Enquanto nada sai, o jeito é se virar com os recicláveis.

De tanto carregar peso, ele conta que adquiriu uma hérnia. E ela, começou a incomodar. Trata-se de uma dor constante. Que o maltrata a todo momento. Henrique estudou somente até a terceira série do fundamental. Não sabe ler nem escrever, direito. Mas acredita que as coisas possam melhorar. “Deus está comigo. Acredito nele, sempre”, disse. A conversa aconteceu com máscaras. Mas ele prefere não usá-la. “Não tenho medo disso. Se fosse pra pegar esse vírus já tinha pegado. Ando por tudo”, disse. Bastou a prosa terminar, pra Henrique virar a esquina. E desaparecer no mundo.



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