Lurdinha deixou bem mais que saudades
Maria de Lourdes Campaner Colli, ou apenas “Lurdinha”, como era conhecida, morreu aos 67, na noite da última quarta feira, após uma parada cardíaca. Estava na linha de frente da Cantina Di Colli. Como proprietária, era a responsável pela qualidade da comida. Tinha um zelo singular, irretocável, de tudo que ali era servido. Era a companheira do memorável Antônio Colli. Um verdadeiro gentleman, morto em 2012, vítima de câncer. Ao lado de um lorde, uma verdadeira dama.
Mas quis o destino que Lourdes contraísse o temido corona, há cerca de 12 dias. Há dez, iniciaram os sintomas. Teve tosse e dor de garganta. Evoluiu com cefaleia. Depois de quatro dias, precisou ser internada. Já tinha os pulmões comprometidos pela infecção. Saturava mal. O quadro piorou, sendo obrigada a ser intubada. Sem leitos de UTI na cidade, foi transferida a Curitiba. Foram seis horas por uma procura desumana em busca de leitos. Uma espera dolorosa e angustiante. Na capital, a vaga foi oferecida pelo Hospital São Lucas. Lourdes evoluiu com descompensação clínica, com a necessidade de diálise. Mas uma parada cardíaca, as 21h de quarta, decretou o fim da luta pela vida.
“Lurdinha” foi a principal idealizadora do restaurante. A responsável pelo desenvolvimento do menu. Criou as massas. Reformulou os molhos. Fiel a boa culinária italiana, enraizada na própria descendência, chegou a acompanhar o trabalho do Madalosso, em Curitiba. Ela tinha como objetivo, traçar uma personalidade própria do seu negócio. Então, ao lado do marido, lançaram o restaurante em Campo Mourão.
Era extremamente caprichosa. Preocupada com a limpeza e a organização da cozinha. Em alguns momentos, ficava triste quando ouvia comentários dizendo que a Cantina já não era mais a mesma, dos tempos do marido. Mas, mesmo enquanto Antônio era vivo, era ela quem cozinhava e cuidava do tempero. “Ela não gostava quando ouvia isso”, disse Ana, a nora.
A dama tinha tom alto na fala. Uma maneira de se impor, principalmente, numa sociedade ainda machista – em casa estava cercada por três homens. Mas, por trás dos bastidores da cozinha, havia uma mulher elegante. Gostava de se arrumar. Estava sempre bem vestida. Tinha gosto refinado pelas coisas boas da vida. Adorava tomar espumantes. Escolhia os melhores restaurantes. Uma vontade infinita em viver.
Há quatro anos, num baile de carnaval promovido por um buffet de Campo Mourão, Lourdes foi uma das primeiras a comprar convite. Entusiasmada, começou a arrumar a fantasia quase dois meses antes da festa. Seus olhos reluziam felicidade. Parecia uma menina, diante da festa de debutante. Naquela noite, a “menina” vestiu-se como uma melindrosa e, certamente, a que mais aproveitou. Dançou. Brincou. Se confraternizou. Era visível a vontade em viver. Ela contagiava o ambiente com alegria.
Com a morte de Antônio, em 2012, a Cantina continuou ser administrada pela família. Lourdes permaneceu, imperial, na cozinha. Os filhos Tonny e Rogério, passaram a desenvolver as funções do pai. O restaurante tornou-se ponto de referência da cidade. Muitos visitantes conciliavam Campo Mourão, a ele. Ou seja, para eles, vir a cidade, sem ir à Cantina, não seria a mesma coisa. A Covid levou mais um talento. Agora, a voz imponente de Lourdes, calou-se. Mas ela continuará presente nas lembranças, e no tempero único da Cantina.
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